terça-feira, 21 de abril de 2015

A QUARTA CAMADA - A ÚLTIMA REUNIÃO

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Aquela foi uma manhã diferente, muita coisa havia mudado e eu havia visto coisas demais para uma vida só. Mesmo assim eu precisava fazer alguma coisa sobre Antônio, que ainda continuava gemendo no quarto ao lado como se não tivéssemos tido aquela conversa. De alguma forma seu corpo não sentia ou sabia o que estava acontecendo, como que se aquela experiência estivesse afetando seu corpo sem que soubesse exatamente o que estava acontecendo. Catarina bateu na porta logo após eu ter me levantado ainda dobrando o lençol ainda molhado de suor devido a intensidade da ultima noite, não havia no quarto nenhuma sensação sobre tudo o que aconteceu, aquele lugar estava intacto e se eu não contasse a ninguém provavelmente eles não perceberiam.

- Bom dia Scott, vamos correndo porque tenho outras coisas pra fazer ainda hoje. Disse a moça abrindo a porta.
- Pensou em nossa ultima conversa senhorita? Há algumas coisas que precisamos conversar o mais rápido possível…
Quando terminei de dizer aquilo fui puxado para dentro do quarto com tanta força que me assustei com Catarina, olhei em seu rosto e ela me pareceu um pouco assustada com o que disse.
- Não me fale sobre isso agora – disse olhando em todas as direções. Hoje o diretor chegou bem cedo e me contou que esta noite foi terrível, está de péssimo humor. Acredite, não é o melhor dia para uma conversa.
- Entendo, mas precisamos conversar, não há como deixar isso para amanhã, é sobre Antônio e tudo que estamos passando aqui nesta casa, vamos tentar um momento para isso Catarina!
Catarina estava estranhamente impressionada pelo pouco que falei sobre nossa conversa. Como estava naquele lugar a mais tempo que eu provavelmente estava escondendo alguma coisa, talvez por medo.

Conseguimos organizar uma pequena reunião aquele dia. Havia um paciente novo e teríamos tempo assim que ele entrasse na sala para conversar com o diretor, Catarina nos prometeu segura-lo ao máximo dentro da sala mesmo que não fosse uma coisa muito fácil. Seria interessante ter alguém lá dentro que buscasse informações sobre quem era e de onde veio aquele rapaz, havia chegado um dia antes e não obtemos nada sobre ele, nem mesmo Catarina tinha informações.
Durante o café da manhã não nos arriscamos em dizer nada, todos agiam como antes e não fomos incomodados por ninguém. Pudemos ver o homem que havia chegado ao dia anterior, mas ele estava encostado num canto, não dizia nada provavelmente devido aos remédios que tomávamos logo no inicio. O diretor realmente estava no local e todos agora estavam apreensivos com a sua presença, provavelmente seria um dia difícil para grande parte daquelas pessoas, mas estes problemas teriam de acabar naquele dia, não havia possibilidade de continuarmos ali no dia seguinte.

A porta da sala do diretor abriu fazendo o estranho rangido que sempre assustava quem estava por perto, dois homens saíram correndo ao verem Catarina saindo e parando ao lado do homem encostado na parede como um moribundo. Ela o tocou com um dos pés para que olhasse para ela, mas não ouve resposta, então agachou bem perto e o chamou para uma breve conversa com o diretor, o qual não revelava seu nome a ninguém, somente Catarina o conhecia, mas ela estava terminantemente proibida de dizer qualquer coisa sobre. Ele olhou respondeu com um olhar de baixo pra cima, foi a primeira vez que vimos seus olhos, lembravam algo como frieza, ao mesmo tempo sentíamos seu desespero, era como uma praia num fim de tarde. Aquele homem era o mais estranho de todos os presentes ali. Assim que a porta da sala bateu novamente nos reunimos na mesa de madeira já envelhecida onde tomávamos café, uma funcionária da cozinha notou algo estranho, mas um de nossos companheiros foi obrigado a fazer algum tipo de ameaça para que ela não contasse nada a ninguém. Fiz uma breve verificação para saber como todos estavam, grande parte deles estava bem, Catarina diminuíra a dose do remédio propositalmente para que pudéssemos estar bem, sentamos todos perto uns dos outros girando a caneca de ferro aquecida pelo café na mesa de madeira envelhecida como fazíamos todos os dias.

- Nesta noite fui visitado por um anjo, novamente, o mesmo que vem me aparecendo durante os últimos dias aqui dentro.
- Você tem tomado os remédios que Catarina nos oferece? Questionou dona Efigênia, o que me deixou um pouco irritado. Deixei a pergunta de lado e continuamos a conversa.
- Todos vocês ouviram os gritos de Antônio no quarto ao lado?
- Tive um sonho estranho com aquele velho, afinal o que está acontecendo Scott? Não temos este tempo todo, daqui a pouco aquela porta vai abrir e ainda não resolvemos nada. Exclamou Juarez de forma ríspida e com razão, estávamos perdendo tempo.
- Pois bem Juarez, o senhor está certo. Creio que a maioria de você compreende o que está acontecendo aqui, então vamos direto ao assunto. Precisamos libertar Antônio, e isso precisa ser hoje!
- Você está louco! Verdadeiramente louco! Gritou Ana, outra prisioneira. – Não conseguimos dar conta nem mesmo de nós, como vamos entrar naquele quarto? Antônio está preso lá há mais tempo que todos juntos aqui, como saberemos se é seguro tirá-lo de lá?
- Ana, entendo que seja difícil imaginar, mas aquele homem conhece mais coisas sobre este lugar do que todos nós juntos. Não temos escolha, fui ordenado que fizesse isso hoje, sem falta. Não há como voltar atrás.

A conversa se desenrolou e o que me deixou impressionado foi como as pessoas ao se sentirem presas ficam cada vez mais presos dentro de si mesmos, aquelas pessoas se tornaram prisioneiras delas mesmas, não havia mais necessidades de remédios. Terminamos repentinamente a conversa assim que ouvimos uma batida dentro da sala do diretor, em poucos instantes a porta foi aberta com tanta violência que deixou uma marca da maçaneta curva na parede. O homem estranho saiu da sala dando saltos para trás e em seguida vimos o diretor saindo assustado e gritando em todas as direções pelos seguranças que em questão de segundos estavam batendo na porta aquela altura presa por uma cadeira que um dos prisioneiros usara para prender do lado de dentro.
- Deixem os guardas entrarem! Gritou o diretor assustado com alguma coisa que havia ocorrido dentro da sala. - Esse homem está louco de verdade e é extremamente perigoso!
- Ele não é tão perigoso assim para nós diretor. Declarou o homem que segurara a cadeira enquanto os guardas batiam freneticamente na porta de ferro pintada de vermelho do lado de fora.
- Vocês! Gritou o estranho. – O que estão fazendo neste local até hoje? Não perceberam que este homem nos aprisionou aqui em favor da Tropa Vermelha? - Mesmo com tamanha confusão aquele homem demonstrava agora uma frieza que por um momento quase nos enganou, mas no fundo sabíamos que aquele era o melhor momento para tentar libertar Antônio e tentar sair daquele lugar, os problemas ficaram maiores quando notamos que somente Catarina tinha as chaves e se ela nos entregasse colocaríamos sua vida em risco, a não se que a trouxéssemos conosco. Foi o que fizemos, enquanto a briga acontecia na entrada da sala eu mesmo me esquivei e entrei pela porta passando por trás do diretor, Catarina estava caída no chão e acordava de algo que entendi ser um desmaio. Roubei as chaves do seu paletó e ao sair novamente fui parado pelo diretor que demonstrava desespero.
- Fique parado aí mesmo seu inútil. Não dê mais um passo… Retirou uma arma da cintura e encostou o cano na minha testa, sentia a quina da mira arranhando ela enquanto ele tremia estranhamente, o que quer que tenha acontecido naquela sala deixou o diretor completamente desesperado e de certa forma eu também estava ficando com aquela arma na cabeça.

- Não se preocupe Scott, em poucos minutos teremos ajuda aqui e poderemos sair como combinado – Exclamou o estranho homem agora com uma expressão completamente mudada.
- Como assim? Perguntou Juarez encostado atrás de uma pilastra. – Estamos todos presos aqui e do lado de fora tem pelo menos uns cinco guardas nos esperando, eles vão entrar e todo mundo aqui vai sofrer.
- Você tem cinco segundos para abrir esta porta, ou vamos ter um terrível acidente com a cabeça deste doido varrido.

Rapidamente o homem que segurava com força uma cadeira de ferro contra a maçaneta da porta se levando para retirar e deixar os guardas passarem, ante que pudesse terminar foi segurado pelo estranho homem, no mesmo instante Catarina apareceu na porta, em uma das mãos segurava o pesado cristo que estava pendurado de cabeça para baixo na sala do diretor, que ao virar-se para ver o que estava acontecendo foi atacado com o cristo de madeira pesada no braço fazendo-o cair. Ainda segurando a arma na mão o diretor teve tempo suficiente para mirar e atirar em Catarina que caia lentamente segurando na batente da porta como que querendo ficar viva, o tiro atravessou o peito da moça, bem próximo do coração, mas ainda assim suficiente para que ela estivesse morta poucos segundos depois. Tentei ajudar ela assim que seus joelhos tocaram o chão, mas senti que estava na mira do diretor novamente, fechei meus olhos naquele momento, não havia mais o que fazer, pensei.

Foi quando notei que podia entrar na quarta camada a qualquer momento, bastou fechar os olhos e me concentrar como havia dito Aion na noite seguinte, meu espanto foi encontrar aquele estranho homem do outro lado, ele estava na quarta camada a tempo e estava bem perto do diretor caído no chão, suas roupas eram outras e ele havia notado minha presença, em volta tudo parecia parado e eu consegui ver que algumas pessoas aparentemente percebiam o que estava acontecendo.
- Olá Scott, vamos terminar com este assunto de uma vez por todas, temos muito o que fazer do lado de fora. – disse com um leve sorriso no rosto, ele voltou sua atenção para o homem caído perto de mim.
- O que vamos fazer com ele? Temos pouco tempo até ele atirar em mim e os guardas entrarem.

Silenciosamente o homem olhou para o rosto do diretor, estava em pé bem perto dele, levantando um dos pés deixou cair com tanta violência que pude ver terra voando debaixo da cabeça do diretor, no entanto o diretor não foi acertado, foi como que se ele tivesse sido tocado de dentro pra fora, após aquele estranho golpe o diretor caiu apagado no chão. Voltei rapidamente para onde estávamos e os guardas socavam a porta com tanta força que o homem que estava com a cadeira cedia aos poucos, certamente eles entrariam. Naquele momento coloquei as duas mãos na cabeça confuso, era possível causar danos nas pessoas estando na quarta camada e vi isso acontecendo naquele exato momento. Olhei espantado para o homem estranho enquanto ele caminhava para a parte externa do local onde estávamos.

- Vá libertar Antônio! Gritou ele enquanto retirava um apito do bolso de sua calça, olhei um instante mais e corri com as chaves na mão. Enquanto ainda nervoso e tremulo eu tentava encontrar uma chave em meio ao molho ouvi um apito fino e angustiante sair de onde aquele rapaz estava, virei para ver o que era e só pude ouvir ele dizendo para outras pessoas assustadas que em breve um leão apareceria para lhes ajudar.

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