quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A QUARTA CAMADA - A REUNIÃO (PARTE 3)

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Às oito da manhã a enfermeira bateu em minha porta para ir tomar café, ela moveu alguns trincos do lado de fora, girou alguma coisa parecido com uma tranca e empurrou a pesada porta de ferro. Eu estava parado em frente à porta quando a enfermeira entrou e num pulo se afastou para que eu saísse.

- Vejo que acordou bem Scott, sonhou com alguém especial?
- Bom dia enfermeira…? Qual é mesmo seu nome?
- Eu me chamo Catarina, se é que isso faz sentido para você… Vá logo tomar o seu café!
- Lindo nome Catarina, me parece um tanto expressiva e comunicativa, há quanto tempo está neste lugar pequeno e mofado?
- A mais tempo do que minha paciência pode suportar, vamos logo, preciso acordar os outros.
- Ah sim, por falar nisso o rapaz do lado não dormiu a noite toda, pude ouvir seu choro durante a madrugada, algo de muito ruim deve ter acontecido. – Estava estranhamento me sentindo bem naquela manhã, como se tivesse prevendo que aquele seria um dia onde venceríamos parte da caminhada e foi o que aconteceu.

Ela me puxou para o lado da porta como se tivesse descoberto algo novo naquele lugar.

- O que ele falava durante a noite? Faz anos que ele está em silêncio, você tem certeza de que sabe do que está falando Scott?
- Creio ser muito forte a dor sentida no coração do meu colega, mas… percebo que seu coração também está sentindo… gostaria de me contar algo, mas se sente impedida Catarina? – Afastei-me um pouco – O momento certo está chegando e quando ele chegar até mesmo você será restaurada…
- Saia daqui seu doido varrido, você não sabe do que está falando… - disse puxando a pesada porta atrás de mim e logo trancando-a. durante o dia não podíamos ficar nos quartos, ficávamos todos no pátio do lado de fora, onde o sol queimava maior parte do tempo ou naquela mesa de madeira envelhecida que rangia toda vez que apoiávamos os cotovelos para conversar.

Catarina saiu em direção os outros quartos e eu me dirigi ao refeitório para encontrar com outros que estavam presos ali, aquele dia seria definitivamente o inicio da libertação dos onze, mesmo que não os conhecesse. Ao parar na porta pude observar aqueles que estavam sentados á mesa e pensar nos motivos que os trouxeram aqui e quais deles eram aqueles que pregariam o inicio do fim. Havia sete pessoas na mesa, eu era o oitavo e havia duas pessoas sendo acordadas, e outras que estavam espalhadas pelos cantos. Alguns sentados outros simplesmente parados olhando o tempo passar. Aproximei-me na mesa e puxei uma cadeira para sentar.

- Bom dia rapaz, sente-se mais próximo, estamos conversando sobre a última noite. Você ouviu todos aqueles gritos? Sabe nos dizer o que aconteceu, já que estava mais perto do que nós?
- Bom dia Juarez, sim, eu ouvi alguns barulhos parecidos com choro, mas não sei o que exatamente aconteceu. Quem é aquele homem do quarto ao lado? Porque ele nunca sai?
- Ele se chama Antônio, passa o dia inteiro no quarto, alguns dos mais antigos dizem que ele está amarrado por ser perigoso demais e desde que cheguei aqui vejo ele trancado naquele quarto… - disse uma senhora sentada á minha frente.
- Gostaria de saber se alguém aqui sabe o motivo de estar internado num manicômio, pergunto isso porque vejo que todos aqui me parecem bem normais. – Todas as respostas foram iguais, ninguém sabia exatamente o motivo de estar naquele lugar e até noite passada eu também não.
- Quantos de vocês estavam, de alguma forma envolvidos com igreja ou algo relacionado a Deus?
No momento que ouviram a palavra Deus, algumas pessoas começaram a chorar em silêncio, outros se assustaram chamando a atenção dos outros que estavam do lado de fora e em poucos instantes o refeitório estava cheio de pessoas olhando para mim, aguardando de alguma forma as palavras que eu não havia preparado para falar…

- Conte-nos Scott, o que você tem para dizer sobre Deus? – Disse a enfermeira Catarina aproximando-se de mim.
Senti meu corpo tremer ao ouvir sua voz ao mesmo tempo em que estranhei sua pergunta. Deslizei a caneca para o lado tentando conseguir forças para levantar e falar na frente de todos que naquele momento olhavam para mim como se tivesse prestes a dar uma notícia ruim, virei para trás para ter noção da distância em que se encontrava a enfermeira, me levantei e me coloquei de frente para todos, ao fazer isso não notei diferença entre os olhares daqueles que estavam presos para o olhar triste e amedrontado da enfermeira Catarina, estava surpreso e iria até o fim para descobrir sua reação.

- Dentre todos que estão nesta casa, Deus escolheu doze para pregar o início das ultimas coisas… Deus me chamou e ordenou que eu viesse até aqui lhes entregar esta mensagem, desde então tive minha vida completamente mudada, comecei a enxergar coisas que antes nem passavam na minha cabeça e entender coisas que minha mente jamais pensaria, creio veementemente que doze dentre nós serão responsáveis por levar uma mensagem àqueles que estão do lado de fora, mesmo que sejamos taxados de loucos…
- Desde quando tem esse tipo de pensamento querido? Como podemos dar crédito ao que está falando se nem o conhecemos? Perguntou à senhora sentada na primeira cadeira. Seu olhar não demostrou desdém, mas estava de alguma forma analisando minha história para ver se falava verdade ou não.
- Não peço que confiem em mim, peço apenas que deixem o mesmo Espírito que me chamou confirmar em vocês a sua vontade, pois é o papel dele modificar o ser humano de acordo com a sua própria vontade.
Ouvimos um estrondo de mãos batendo na mesa, a enfermeira Catarina, tremula e molhada de suor com a notícia colocou a cabeça entre os braços debruçados na mesa repetindo com voz tão trêmula quanto seu corpo – Não pode ser… não pode ser verdade…
- O que está acontecendo Catarina? – Perguntou Juarez – sente-se tocada por este recado? Há algo que gostaria de compartilhar conosco?
Catarina ajeitou os cabelos para trás da orelha e ao levantar exibia um semblante de susto e medo, por um momento pude ver o brilho do sol resplandecendo em seu rosto molhado pelas lágrimas e sabia que ela seria uma das pessoas escolhidas, mas não cabia a mim dizer isso naquele momento. Apenas fiquei observando enquanto ela dizia sobre algo que vinha sonhando.

- Já tenho tido estes sonhos há algum tempo, nele estamos sempre em conjunto visitando uma comunidade distante e aparentemente perigosa a fim de vermos um culto prestado sempre no mesmo horário e quando o culto termina ficamos parados no lugar e descobrimos que aqueles que ainda não saíram na verdade são escravos dos donos do lugar, então fugimos, sempre fugimos para o mato enquanto somos perseguidos…
- Está dito Catarina, estes sonhos que te assombram são um recado daquilo que acontecerá – disse tocando seu ombro. Amigos, entramos em um acordo sobre este lugar…
- Que todos aqui eram pessoas de Deus, mas foram escravizadas com a desculpa de sermos loucos – completou Juarez – Ótimo plano para calar a cidade da verdade, ainda mais em nossos dias. Fiquei sabendo que um grande líder mundial conseguiu com a ONU o agrupamento de todos os governos para exercer um só poder…
- A grande tropa vermelha da paz – resmungou Catarina – Eles detêm todo o poder das nações há muito tempo, mas agora estão formalizando tudo, nós somos contratados por eles para manter vocês aqui… o grande plano é calar a religião mundial, principalmente o cristianismo e como eles não podem simplesmente mata-los alimentam vocês como se fossem loucos…
- Precisamos ser discretos enquanto estamos aqui. – Disse Ana, agora com seu nome revelado – Estes homens são cachorros mandados para nos parar e nós caímos como patos nesta armadilha.
- Peço desculpas… por ter participado por tanto tempo nos planos da grande tropa da paz… não vejo como pagar vocês esta dívida, mas creio que posso ajudá-los a sair deste lugar…

Neste momento as trancas da porta principal giraram deixando o ruído do aço penetrar nossos ouvidos. Interrompemos a conversa e continuamos a tomar café como se nada houvesse acontecido. Na porta um homem forte vestindo um uniforme cinza com linhas vermelhas entrou carregando outro amarrado numa camisa de força se contorcendo na tentativa de escapar. Seus olhos moviam-se por toda parte como se procurando um ponto de fuga, os quais sabiam não existir. Logo foi levado para dentro da sala do diretor para ser avaliado e em seguida ser colocado num quarto até que se acalmasse, naquele dia não pudemos ver o rosto ou saber o nome de quem havia chegado e então ficamos na casa sobre a ordem de assim que fossemos dormir apresentar-se a Deus em oração. Naquela noite aquele lugar tremeria se dependesse da nossa vontade de estar com Deus.

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